Florianita Oleron: de vereadora a vítima da opressão política
O Portal da Câmara de Vitória prossegue a coluna “Nossa História” trazendo a segunda parte da vida legislativa da primeira mulher vitoriense a ter assento na Casa Diogo de Braga, a Profa. Florianita Oleron. O documentário faz parte de uma Trilogia histórica das três únicas mulheres que alcançaram a condição de parlamentares. Iniciamos com Florianita Oleron, para depois prosseguir com Iara Gouveia e encerrarmos este documentário com Fátima Carneiro. Florianita nesta segunda parte conta os bastidores políticos de sua atuação, as perseguições sofridas e o que pensa do momento político vivenciado
No término de seu mandato, Florianita Oliveira da Silva é chamada por Dr. Ivo Queiroz para contribuir com a eleição de seu sucessor na disputa de 1972, o médico apresenta como candidato o vereador Joca Néri (PSD). Florianita Oleron havia discordado da escolha alegando que Néri detinha um perfil antipopular. Mesmo ressabiada com o candidato apresentado, Oleron deu um crédito ao médico e chegou a discursar no palanque a favor de Néri, em um comício tomado pela multidão e enfeitado por folhas de bananeira (a marca de Dr. Ivo). Entenda melhor clicando AQUI.
No outro dia, os principais líderes da oposição procuram Florianita Oleron para uma conversa. O candidato apresentado pela oposição era o empresário do Engarrafamento PITU, José Augusto Ferrer de Moraes (MDB). Acompanhado de José Leal, Zé Augusto tenta convencer Florianita de que Joca Néri não representava os interesses dos segmentos sociais preocupados com as questões da municipalidade. “Mesmo sabendo das dificuldades políticas da eleição de Joca, não estava a vontade para mudar de posição, tendo em vista que na noite anterior havia declarado voto a ele, atendendo pedido de Dr. Ivo, apesar de saber que Zé Augusto era um bom nome”, relutou Oleron.
Na eleição anterior, a família Oleron havia rompido com o grupo de João Cleofas (da UDN), por ter apresentado Elias de Miringaba. O fato levou Florianita a se aproximar de Dr. Ivo Queiroz (PSD). “Eu me lembro de certa vez em um jantar para trocar informações políticas, João Cleofas me alertou quem seria Dr. Ivo”, mencionou.
Questionada quanto a opinião de Cleofas sobre Dr. Ivo, ela descreveu: “Dr. Ivo é um micróbio que vai ser difícil exterminá-lo de Vitória de Santo Antão”, vaticinou o então Ministro da Agricultura João Cleofas.
Sua previsão política quanto a vulnerabilidade de Néri estava correta, Zé Augusto saiu vitorioso naquele pleito. “Zé Augusto era um prefeito engraçado, porém dinâmico com a coisa pública. Era honesto, austero com o dinheiro público e muito humano. Foi um excelente prefeito!”, atestou Florianita no depoimento a equipe do Portal da Câmara de Vitória. No momento da visita, os líderes da campanha de Zé Augusto tentaram de todas as formas conseguir o apoio da vereadora. Zé Leal em certo momento chegou a ser taxativo: “Florianita! Tome meu cheque em branco e coloque o valor que você quiser nele que eu assino”, contou ela.
Foi a segunda oportunidade que as conjecturas políticas lhe forneceram para ficar rica, mas Florianita não cedeu: “Minhas mãos ficaram tremendo segurando a folha do cheque de Zé Leal”, recordou. Ela recusou a oferta. “Desafio a qualquer político de Vitória de Santo Antão que tenha feito algum tipo de conchavo comigo”, assegurou Florianita Oleron, atestando veementemente com as mãos a sua envergadura política e honestidade com a coisa pública.
Já a primeira oportunidade que teve de enricar com a política e também deixou passar, foi quando acabou procurada pelos movimentos de esquerda que davam sustentação as Ligas Camponesas, movimento dos trabalhadores rurais em defesa da reforma agrária, tendo o Engenho Galileia, em Vitória de Santo Antão, local de seu nascedouro, se espalhando por todo o Nordeste.
Antes do Golpe Militar de 1964, Florianita Oleron atuava como gestora escolar quando conviveu com a vitoriense Maria Celeste, uma das que se tornou líder das Ligas Camponesas. “Maria Celeste era uma de nossas professoras. Moça muito inteligente que depois abraçou a causa dos camponeses”, descreveu ela. A mãe de Florianita gostava muito de Celeste e ajudou em diversos momentos a sua família, relembrou.
Contudo, Maria Celeste acompanhada do Deputado Estadual Francisco Julião (do PCB), o advogado defensor dos camponeses, chegou a procurar Florianita Oleron em sua casa para lhe oferecer uma proposta. Segundo relato de Florianita, Julião havia lhe pedido o apoio público da parlamentar para apoiar a invasão do Engenho Galileia, atestando a nobreza política do ato. “A tomada do Engenho será feita, basta a senhora defender a causa”, esclareceu o advogado.
De pronto, a vereadora declarou que era nobre a mobilização dos trabalhadores rurais, afirmando inclusive que tomou ciência de uma série de arbitrariedades cometidas pelos latifundiários contra os camponeses, porém não poderia concordar com “invasões de terras”, tendo em vista que para ela a propriedade estava dentro da legalidade. “Meu Deus! Defender invasão! Isso nunca!”, retrucou Oleron a Julião e a Celeste. A proposta oferecida, caso ela aceitasse, seria contratá-la pelo Estado com um salário pomposo.
Após a resposta negativa, Oleron relatou que a partir de então não teve mais sossego na vida, pois o Governo do Estado desde quando Miguel Arraes assumira, lhe perseguiu sistematicamente.
“A dignidade é o que levamos desta vida”, retrucou Oleron contando mais uma vez que deixou de melhorar sua vida financeira por ser leal a sua consciência. “Dr. Arraes teve finos propósitos durante os seus governos, porém a nossa relação com o governo dele era muito difícil. Desde então, Celeste deixou de falar comigo e acabei preterida no setor de Educação, passando por sérias dificuldades financeiras”, relatou a professora Florianita.
Segundo ela, depois disso sua situação ficou insustentável ao longo dos anos. Como educadora ela foi jogada em lugares distantes para prestar os seus serviços ao Estado, em muitos momentos, em condições insalubres e que a fez inúmeras vezes ficar distante de seu marido e filhos. Florianita Oleron entra em depressão. As pessoas que ela considerava que poderia contar com a intermediação junto ao Governo, ficaram reticentes em colaborar para lhe encontrar um lugar decente que lhe permitisse ganhar sua remuneração enquanto servidora pública. “Estava desesperada com a pressão do Governo do Estado”, sentenciou.
Florianita Oleron não pensou duas vezes… quase tenta o suicídio, após mais uma vez lhe negarem uma colocação de trabalho perto de seus familiares. Ela se dirigiu ao prédio da Secretaria de Educação na Rua Siqueira Campos, em Recife. Lá tentou pular do prédio, quando nos corredores acabou esbarrando com o Padre Pedro Souza Leão, que chegou a ser prefeito por duas vezes da cidade de Glória do Goitá, na Mata Norte do Estado. Percebendo seu semblante desesperado, Pe. Souza Leão lhe abraçou e pediu para Oleron se acalmar. Disposto em ajudá-la, o padre voltou com ela a sala de Merval Jurema (na Educação) e interviu a seu favor.
Por intermédio do Pe. Souza Leão, Florianita Oleron foi indicada para atuar em uma escola de Prazeres, em Jaboatão dos Guararapes. “Lá quem me recebeu foi Lourdes Chaves, uma amiga da minha mãe, que ficou desconfiada com a minha Portaria e com medo acabou me encaminhando para assumir uma turma com 25 alunos em uma escola distante do Centro de Prazeres”, relatou. Apesar das dificuldades neste período, foi o caminho que lhe permitiu retomar suas funções como servidora pública do Estado.
Uma de suas últimas contribuições à Educação e a Cultura, foi quando ficou a disposição do Município de Vitória, convidada pelo então prefeito Elias Alves de Lira para fundar o Centro de Cultura Escritor Osman Lins, no Bairro do Livramento, onde comandou por 16 anos. “Eu sou testemunha de como Elias Lira começou sua vida pública. No início era um homem bom, de palavra. Hoje está corrompido pelas negociatas políticas”, vaticinou Florianita Oleron. Ela contou que Elias Lira a tinha como conselheira política e chegou a participar de várias reuniões com eles e Marco Maciel. “Quem lançou Elias Lira para prefeito em 1982 foi Dr. Ivo Queiroz”, recordou.
Depois que Lira rompeu com Dr. Ivo, as relações ‘azedaram’ para ela. O então prefeito Elias Lira determina a exoneração de Florianita Oleron do Centro Osman Lins mandando ela retirar suas coisas no prazo de 72 horas. “Nossa foi terrível! Quase entro em depressão novamente”, desabafou, deixando evidente sua mágoa com o atual prefeito.
A exoneração saiu um dia depois que Florianita Oleron foi homenageada pela Escola Militar do Recife pela sua nobre contribuição a memória do escritor vitoriense Osman Lins e o seu trabalho desenvolvido na instituição ao longo dos 16 anos.
Questionada quanto a polarização política entre Elias Lira (PSD) e José Aglaílson (PSB), Oleron considera que é um ciclo político que está sendo superado e opinou quanto ao governo de Aglaílson. “Reconheço que o governo de Aglailson se aproxima dos apelos populares, porém nos seus dois mandatos na Prefeitura de Vitória lhe faltou foco para dinamizar a gestão, seu governo deixou saldos negativos com a ingerência de seus filhos, este ponto foi bastante prejudicial. Faltou-lhe capacidade administrativa”, avaliou.
Finalizando, Oleron lamenta que atualmente as questões políticas de modo geral estejam vulgarizadas. Diante de sua colaboração a Vitória de Santo Antão opinou que sua história não é devidamente lembrada. A única homenagem preponderante que recebeu até agora foi o título de Cidadã Vitoriense, que lhe foi outorgado na década de 1980 pelo ex-vereador J. Marinho.
“Lamento que a nossa Vitória de Santo Antão esteja perdendo a sua identidade cultural. As pessoas hoje não ligam para a cultura. Sem contar que a educação vive uma profunda mercantilização. Hoje ninguém respeita o passado! Posso me considerar uma mulher vencedora. A dignidade é um dos únicos elementos que levamos consigo”, verbalizou. (LN/Equipe).
CONFIRA A PRIMEIRA PARTE DESTE DOCUMENTÁRIO AQUI.
Assista ao vídeo…
Julho 2013
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